sexta-feira, 31 de maio de 2019

As memórias da antiguidade presas nas geleiras ao redor do mundo.

Em meio ao zumbido de máquinas em um laboratório abarrotado na Suíça, François Burgay fala do “céu aberto” sobre o Mont Blanc, o monte mais alto dos Alpes e o maior da Europa. “A 4.200 metros acima do nível do mar, você nunca imaginaria que a noite fosse tão clara”, diz ele. É a ausência de poluição luminosa da Terra que dá ao céu essa característica única.

“Acho que posso falar por muitos dos meus colegas quando digo que para fazer este trabalho você precisa ser essencialmente um explorador”, diz Burgay sorrindo.
O homem é glaciologista, ou seja, um estudioso de geleiras na Universidade Ca’ Foscari de Veneza, na Itália. Ele acampou durante uma semana em agosto de 2016 no icônico pico que separa o país da França. Foi a primeira missão de campo que fez na carreira.
Como parte de um projeto chamado Ice Memory (ou Memória de Gelo, em tradução livre), ele esteve no local para coletar amostras de gelo do glaciar Col du Dome, posteriormente armazenadas no laboratório em Grenoble, na França.
Um dia, esperam os pesquisadores, parte desses núcleos de gelo será levada à Antártida, onde cofres feitos sob medida com neve vão preservar por séculos o conhecimento contido neles.
Após esta primeira missão, a equipe encarou a montanha Illimani na Bolívia, desta vez alcançando uma geleira ao lado de um pico de 6.300 metros de altitude e coletando núcleos que precisaram ser transportados a pé, já que não havia helicópteros disponíveis.
O monte Kilimanjaro, na Tanzânia, é o próximo da lista, com uma expedição planejada para o final deste ano, e mais geleiras ameaçadas virão em seguida, à medida que novos parceiros internacionais aderirem à iniciativa franco-italiana.

Corrida contra o tempo

Pesquisas mostram que as geleiras do mundo têm diminuído dramaticamente há algum tempo, provavelmente devido a mudanças climáticas provocadas pelo homem. O Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC) das Nações Unidas estima que, se o aquecimento global continuar nesse ritmo, a maior parte da cobertura de gelo do planeta poderá ser perdida até o final do século, com exceção das camadas de gelo da Groenlândia e da Antártida.
“As geleiras do mundo estão literalmente desaparecendo sob nossos pés”, diz Carlo Barbante, um paleoclimatologista também da Universidade Ca’ Foscari e um dos fundadores do projeto Ice Memory. Para 1,5 bilhão de pessoas que dependem das geleiras para beber água e fazer irrigação, essa é uma situação catastrófica. Mas o gelo também oferece um mundo de informações.
“Nós muitas vezes nos concentramos nas ameaças imediatas trazidas pelo derretimento do gelo, como a falta de água em áreas vulneráveis ​​como o subcontinente indiano”, diz Barbante. “Mas, como cientistas que estudam o gelo como um arquivo, entendemos que também estamos perdendo informações fundamentais. Sentimos que precisávamos fazer alguma em relação a isso.”
Juntamente com climatologistas franceses e glaciologistas, Barbante e sua equipe partiram para resgatar amostras de gelo das geleiras do mundo. Cada núcleo de gelo representa um arquivo precioso da história que se estende por milhares de anos até o passado.
Presos no gelo estão minúsculas bolhas de gás, partículas de poeira, pólen e até minúsculos organismos que podem fornecer uma janela fundamental para o estudo de eventos que aconteceram antes de os registros humanos começarem.
Atualmente, os pesquisadores extraem um metro por vez dos núcleos de gelo, perfurando a superfície da geleira, realizando uma primeira análise visual do núcleo antes de prepará-lo para o transporte em contêineres que normalmente têm 10 cm de largura.
Esse processo é repetido centenas de vezes à medida que os pesquisadores vão cada vez mais fundo para capturar camadas mais antigas de gelo, chegando a atingir profundidades extremas, de até 900 metros.
À medida que eles cavam, cada metro de gelo se mostra mais comprimido pelo peso das camadas de cima, o que significa que conserva produtos químicos e outras partículas acumuladas por períodos mais longos.

Análise detalhada

No laboratório, os núcleos são limpos e as amostras são derretidas lentamente em um ambiente controlado, para que os glaciologistas possam analisar a água e identificar nela metais ou gases, como o dióxido de carbono.
“O gelo também funciona como um paleotermômetro”, diz Burgay. “Ele registra as temperaturas do ambiente onde uma certa cobertura de neve caiu em algum momento.”
Usando essas informações, os pesquisadores podem reconstruir a evolução do clima da Terra ao longo de milênios, fornecendo informações valiosas que os cientistas podem usar para ‘reproduzir’ as mudanças climáticas.
As máquinas no laboratório de Burgay, por exemplo, estão atualmente buscando vestígios de ferro em partes de gelo com 6.000 anos de idade, extraído de um núcleo da Groenlândia. Os níveis mínimos de metal podem dar pistas sobre a atividade vulcânica antiga que lançou poeira metálica na atmosfera.
Após a limpeza, os núcleos restantes são preparados para armazenamento de longo prazo no repositório.
“Pode-se argumentar que os núcleos de gelo estariam seguros em uma geladeira comercial em Veneza ou Paris”, diz Barbante.
“Mas não estamos pensando a curto prazo. Nós não podemos prever se daqui a 200 anos alguém ainda vai poder pagar a conta de energia”. A história, segundo ele, mostra como conflitos e mudanças de prioridade de pesquisas, além dos desastres naturais, dificultam a previsão de futuro de qualquer empreendimento científico de longo prazo.
Isso tem levado os cientistas a buscarem uma solução mais definitiva.
“A Antártica é o lugar mais seguro para armazenar as amostras”, diz Barbante, “Primeiro, porque é uma geladeira natural, com temperaturas médias anuais em torno de -50ºC, e também porque não pertence a nenhum país específico. É a região ideal para empreendimentos científicos pacíficos”.
Assinado em 1959 e em vigor desde 1961, o Tratado da Antártida reúne 53 países ativos na região, estipulando que o território “será utilizado apenas para fins pacíficos” e que “observações científicas e resultados dos experimentos na Antártida serão compartilhados e disponibilizados gratuitamente”.
Enquanto o tratado for mantido, diz Bess Koffmann, geóloga da Universidade do Maine, nos EUA, a Antártica continuará sendo um lugar seguro. O documento, porém, deve ser renegociado daqui a 30 anos.
“Há sempre o risco de um país se recusar a assinar o acordo para tirar proveito dos recursos inexplorados da região, como os minerais”, alerta Koffmann.
Criar um santuário para o gelo que está desaparecendo também pode oferecer benefícios inimagináveis ​​hoje. À medida que novas ferramentas e tecnologias vão ficando disponíveis, isso pode permitir aos cientistas abrir novas janelas para desbravar o passado do planeta, e talvez até estudar vírus e bactérias antigos preservados no gelo.

Tecnologia

“As tecnologias evoluíram rapidamente nas últimas décadas, e nós agora estamos fazendo medições que nem sonhávamos serem possíveis há 30 ou 40 anos”, diz Koffmann.
Um dia, diz Barbante, as técnicas de imagem serão tão avançadas que “vamos poder analisar os núcleos sem nem precisar tocá-los”.
“Mas, para chegar a esse ponto, é essencial construir repositórios enquanto ainda podemos”, diz Emma Smith, glaciologista e geofísica do Instituto Alfred Wegener, em Bremerhaven, Alemanha. “Estamos perdendo nossas geleiras muito rapidamente, e, sem arquivar as informações que elas contêm, simplesmente não estamos nos dando a chance de entender as mudanças que podem acontecer no futuro.”
Os cientistas geralmente se concentram no gelo polar porque é onde eles podem descobrir os registros mais antigos, diz Smith. “Mas se você observar os núcleos de gelo regionais de geleiras menores, poderá ver mudanças em uma escala muito menor”. Isso significa criar uma imagem detalhada dos climas locais, o que não seria possível analisando somente o gelo polar.
A equipe do Ice Memory espera ter uma grande variedade de amostras prontas para serem armazenadas na Antártida até 2020, em um cofre construído sob medida perto da estação de pesquisa franco-italiana Concordia.
Os pesquisadores planejam empregar um método que foi testado com sucesso na Groenlândia, que envolve escavar um fosso e inserir nele um balão inflável que será usado como molde para o depósito.
“Em seguida, colocamos a neve que havíamos removido para criar o fosso de volta na estrutura e esperamos ela endurecer por alguns dias”, explica Barbante. O balão é então esvaziado nesse ponto e pode ser facilmente removido.
“Dessa forma, criamos uma estrutura natural de baixo custo e sem impacto ambiental.”
Barbante admite que depois de uma ou duas décadas a estrutura provavelmente vai diminuir sob o peso de mais neve caindo sobre ela. “Mas os núcleos podem ser movidos com relativa facilidade para uma nova estrutura construída da mesma maneira”, acrescenta.
O projeto já conquistou o apoio da Unesco, e Barbante diz que um número crescente de equipes, incluindo de países como Rússia, Estados Unidos e China, já está coletando material extra durante suas expedições independentes, para que possam contribuir com o projeto no futuro.
De acordo com projeções atuais, não importa o que façamos agora para reduzir as emissões globais de gases do efeito estufa, muitas das geleiras do mundo têm pouca esperança de sobreviver além de algumas gerações humanas, com parte delas perdendo um terço de seu gelo no próximo século. Logo, essas poucas centenas de metros de núcleos de gelo poderão ser tudo o que restou da informação antiga armazenada no gelo.
Os esforços de alguns destemidos exploradores que se aventuram nas montanhas para coletar esses núcleos estão ajudando a garantir que os segredos contidos neles estejam disponíveis para as próximas gerações decifrarem.
Fonte: BBC

quinta-feira, 30 de maio de 2019

O pior acidente nuclear da história transformou Chernobyl em algo que ninguém esperava.

Em 26 de abril de 1986, o reator número quatro da Usina Nuclear de Chernobyl sofreu uma explosão durante um teste técnico na então União Soviética, atual Ucrânia.

Como resultado desse acidente, mais de 400 vezes mais radiação foi emitida na região do que a liberada pela bomba atômica derrubada pelos americanos na cidade japonesa de Hiroshima em 1945.
Até hoje, Chernobyl é o maior acidente nuclear da história. O trabalho de descontaminação começou imediatamente após o desastre. Uma zona de exclusão foi criada em torno da fábrica e mais de 350.000 pessoas foram evacuadas. Elas nunca mais voltaram. Severas restrições ao assentamento humano permanente ainda estão em vigor hoje.
Isso pode ser, inclusive, uma das razões pelas quais a área tem prosperado.

O acidente

O acidente teve um grande impacto na população humana. As estimativas do número de mortes variam muito. Embora não existam números conclusivos, a perda de vidas humanas e consequências fisiológicas foram enormes.
O impacto inicial no meio ambiente também foi importante. Uma das áreas mais fortemente afetadas pela radiação foi a floresta de pinheiros perto da usina, conhecida desde então como “Floresta Vermelha”.
Esta área recebeu as maiores doses de radiação – os pinheiros morreram instantaneamente e todas as folhas ficaram vermelhas. Poucos animais sobreviveram aos níveis mais altos de radiação.
Sendo assim, logo após o acidente assumiu-se que a área se tornaria um deserto para a vida. Considerando o longo tempo que alguns compostos radioativos demoram para desaparecer do ambiente, a previsão era de que a área permanecesse desprovida de vida selvagem por séculos.

A surpresa

Hoje, 33 anos após a catástrofe, a zona de exclusão de Chernobyl, que abrange pedaços da Ucrânia e Belarus, é habitada por ursos marrons, bisontes, lobos, linces, cavalos-de-przewalski e mais de 200 espécies de aves, entre outros animais.
Em março de 2019, diversos grupos de pesquisa que estudam a fauna de Chernobyl se reuniram em Portsmouth, na Inglaterra, para apresentar os resultados mais recentes dos seus trabalhos – cerca de 30 pesquisadores do Reino Unido, Irlanda, França, Bélgica, Noruega, Espanha e Ucrânia.
Estes estudos incluíram trabalhos sobre grandes mamíferos, nidificação de aves, anfíbios, peixes, abelhas, minhocas, bactérias e folhas.
Os resultados indicam que a região abriga atualmente grande biodiversidade. Além disso, os cientistas confirmaram a falta geral de grandes efeitos negativos dos níveis atuais de radiação nas populações de animais e plantas que vivem em Chernobyl.
Todos os grupos estudados mantêm populações estáveis ​​e viáveis ​​dentro da zona de exclusão.

TREE

O projeto TREE (TRansfer-Exposure-Effects, liderado por Nick Beresford, do Centro de Ecologia e Hidrologia do Reino Unido) instalou câmeras de detecção de movimento em diferentes áreas da zona de exclusão, que ficaram ligadas por vários anos.
As fotos tiradas revelam a presença de fauna abundante em todos os níveis de radiação. As câmeras fizeram a primeira observação de ursos marrons e bisontes europeus dentro do lado ucraniano da zona, bem como o aumento no número de lobos e cavalos-de-przewalski.
O trabalho sobre anfíbios em Chernobyl também detectou populações abundantes em toda a zona de exclusão, mesmo nas áreas mais contaminadas.
Além disso, foram encontrados sinais que podem representar respostas adaptativas à vida com radiação. Por exemplo, as rãs dentro da zona de exclusão são mais escuras do que as rãs que vivem fora dela, o que é uma possível defesa contra a radiação.

Efeitos negativos

Vale mencionar que os estudos detectaram alguns efeitos negativos da radiação em um nível individual.
Por exemplo, alguns insetos parecem ter uma vida útil mais curta e são mais afetados por parasitas em áreas de alta radiação. Algumas aves também apresentam níveis mais elevados de albinismo, bem como alterações fisiológicas e genéticas quando vivem em localidades altamente contaminadas.
Mas esses efeitos não parecem afetar a manutenção da população de animais selvagens na área.

Impacto humano x nuclear

A ausência geral de efeitos negativos da radiação sobre a vida selvagem de Chernobyl pode ser uma consequência de vários fatores. Primeiro, a vida selvagem pode ser muito mais resistente à radiação do que se pensava anteriormente.
Outra possibilidade é que alguns organismos poderiam estar começando a mostrar respostas adaptativas que lhes permitiriam lidar com a radiação e viver dentro da zona de exclusão sem ter danos.
Além disso, a ausência de seres humanos dentro da zona de exclusão pode favorecer muitas espécies, grandes mamíferos em particular. Talvez as pressões geradas pelas atividades humanas sejam mais negativas para a vida selvagem no médio prazo do que um acidente nuclear – uma visão bastante reveladora do impacto humano sobre o ambiente natural.

O futuro de Chernobyl

Em 2016, a parte ucraniana da zona de exclusão foi declarada como reserva radiológica e ambiental pelo governo nacional.
Ao longo dos anos, Chernobyl também se tornou um excelente laboratório natural para o estudo de processos evolutivos em ambientes extremos, algo que poderia ser valioso, dadas as rápidas mudanças ambientais experimentadas em todo o mundo.
Atualmente, vários projetos estão tentando retomar as atividades humanas na área. O turismo vem florescendo em Chernobyl, com mais de 70.000 visitantes em 2018.
Há também planos para o desenvolvimento de usinas de energia solar na área e para a expansão do trabalho florestal. No ano passado, houve até uma instalação de arte dentro da cidade abandonada de Prypiat.
Nos últimos 33 anos, Chernobyl deixou de ser considerada um deserto em potencial para se tornar uma área de grande interesse para a conservação da biodiversidade. Pode parecer estranho, mas agora precisamos trabalhar para manter a integridade da zona de exclusão como uma reserva natural, para garantir que Chernobyl continue a ser um refúgio para a vida selvagem. [ScienceAlert]
Fonte: Hypescience

quarta-feira, 29 de maio de 2019

Silvicultura intensiva acelera regeneração da biodiversidade na Mata Atlântica.

Um experimento realizado na Mata Atlântica sugere que a silvicultura intensiva – com uso de herbicida e maior quantidade de fertilizantes – é mais eficaz para promover a regeneração de florestas tropicais e o ganho de biomassa do que o método tradicional, baseado no controle do capim com roçada e menor adubação.

O estudo foi coordenado por Pedro Henrique Santin Brancalion, professor de Silvicultura de Espécies Nativas no Departamento de Ciências Florestais da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo (USP), e teve apoio da FAPESP.
O trabalho contou com a participação de pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Botucatu, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e do Centro Francês de Pesquisa Agrícola para o Desenvolvimento Internacional (Cirad). Os resultados foram publicados na revista Ecological Applications, da Ecological Society of America.
Como explicou Brancalion, atividades de reflorestamento são consideradas estratégicas para mitigar as mudanças climáticas, pois a vegetação sequestra carbono da atmosfera à medida que se desenvolve.
“Há programas promovidos por países como a Noruega para ajudar a neutralizar as emissões de gás carbônico de suas atividades econômicas. Há empresas que lançam editais de apoio a projetos de reflorestamento para neutralizar parte das emissões de suas fábricas e há inúmeras ONGs internacionais que captam recursos de empresas interessadas em investir nos projetos de reflorestamento de espécies nativas no Brasil”, disse.
Segundo o pesquisador, maximizar o acúmulo de biomassa lenhosa nas áreas reflorestadas, a fim de obter pagamentos antecipados pelo estoque de carbono, é essencial para a viabilidade financeira desses programas promovidos pelos esforços de mitigação climática.
A silvicultura intensiva, usada no cultivo comercial de eucalipto e pinus para aumentar a produtividade e o lucro, é defendida como uma abordagem promissora para aumentar o acúmulo de biomassa lenhosa em plantios de restauração. No entanto, explicou Brancalion, há quem questione se tal abordagem dificultaria a regeneração natural da floresta e a sucessão ecológica devido à alta competição entre plantas colonizadoras e árvores plantadas.
“Em diversas situações é preciso plantar espécies de árvores nativas. Como fazer para que essas áreas de plantação de árvores nativas maximizem o estoque de carbono? Para encontrar respostas, realizamos um experimento controlado de plantio de árvores nativas”, disse. 
O experimento foi conduzido na Estação Experimental de Ciências Florestais, da Esalq, situada próximo ao município de Anhembi. A área foi doada à USP em 1974 pela Companhia Energética de São Paulo (Cesp) para fins acadêmicos e científicos. A partir de então, sob a administração do Departamento de Ciências Florestais da Esalq, a Estação Experimental de Ciências Florestais – Anhembi passou a realizar uma série de pesquisas voltadas à introdução, conservação e melhoramento genético de espécies florestais exóticas e nativas, constituindo-se em um importante banco de germoplasma para o setor florestal mundial.
“Investigamos, nessa área de Mata Atlântica, os impactos de diferentes abordagens de silvicultura aplicadas ao plantio de espécies arbóreas nativas, tanto no que diz respeito ao acúmulo de biomassa lenhosa quanto na regeneração espontânea de espécies lenhosas nativas”, disse Brancalion.
Por ser um trabalho com árvores, muitas de crescimento lento, a pesquisa começou em 2004. O experimento foi montado em uma área de pastagem coberta por capim braquiária.
“Testamos três estratégias principais. A primeira envolveu, na seleção de espécies, a elevação da proporção de espécies pioneiras no plantio, ou seja, aquelas mais rústicas, que demandam muita luz do sol, de pequeno a médio porte, e de crescimento rápido. A composição ideal que buscava encontrar seria aquela que resultasse em um maior estoque de carbono, mas que ainda assim permitisse a regeneração de espécies semelhantes às de uma mata nativa, e não a de um mero bosque de árvores sem regeneração”, disse Brancalion.
De acordo com o pesquisador, são chamadas de espécies pioneiras aquelas que se regeneram inicialmente em uma floresta. São árvores que crescem muito rápido, tem madeira pouco densa e morrem cedo, em torno de 10 anos. “Elas são importantes para reocupar clareiras nas florestas e áreas degradadas, pois rapidamente formam uma estrutura florestal. Já as espécies não pioneiras crescem mais devagar e duram décadas ou séculos”, disse.
No experimento foram usadas 20 espécies arbóreas nativas. Entre as espécies pioneiras havia, por exemplo, cedro, amendoim-bravo, aroeira-vermelha, angico-branco e timbaúva. Entre as árvores de crescimento mais lento constavam mudas de jequitibá-branco, ipê-roxo, jatobá e jacarandá. Havia ainda diversas outras espécies, de crescimento intermediário, como copaíba, pitangueira, jenipapeiro, goiabeira e jerivá, entre muitas outras.
Foram testados plantios com proporção igual de espécies pioneiras e não pioneiras (50% cada) e com relação de dois para um, ou seja, 67% de mudas pioneiras para 33% de mudas não pioneiras.
“A segunda estratégia de plantio jogou com o adensamento na quantidade de árvores por hectare plantado. A questão que se queria ver respondida era se o aumento na quantidade de árvores maximizaria a estocagem de carbono ou se, ao contrário, uma densidade menor reduziria a competição entre as plantas acarretando assim em árvores maiores e um consequente maior estoque de carbono”, disse Brancalion.
Os pesquisadores trabalharam com um espaçamento entre linhas de plantio de 3 metros, e entre mudas plantadas nas linhas de 2 ou 1 metro. Assim, a área com menor adensamento possuía 1.666 mudas, enquanto a de maior espaçamento, 3.333.
A terceira estratégia de plantio envolveu um manejo mais intensivo, com controle de plantas daninhas com herbicida e adubação mais carregada.
“Reunimos diversas medidas ao longo de 12 anos. As diferentes técnicas que testamos resultaram em florestas bem diferentes do ponto de vista do estoque de carbono, variando de 25 até 75 toneladas por hectare”, disse Brancalion.
Regeneração em floresta nativa
O adensamento no plantio de mudas e a relação variável entre espécies pioneiras e não pioneiras não resultaram em alterações significativas na estocagem de carbono. Já o melhor manejo, aliado ao uso de herbicida e adubação diferenciada, foi o que obteve melhores resultados em todos os experimentos.
“A quantidade total de árvores e a maior quantidade de pioneiras não foram fatores que influenciaram significativamente o ganho de biomassa”, disse Brancalion.
“A segunda pergunta que queríamos ver respondida era saber se o plantio de mudas serviria para desencadear um processo de regeneração que desembocaria em uma floresta nativa biodiversa. Ou se, caso isso não ocorresse, a área continuaria sendo um bosque de plantação. Também queríamos saber se o favorecimento da estocagem de carbono prejudicaria a regeneração das espécies nativas”, disse Brancalion.
“O resultado ao qual chegamos foi o melhor dos cenários. Verificou-se uma sinergia entre a estocagem de carbono e a regeneração de espécies nativas, o que é excelente”, disse.
O estudo foi financiado pela FAPESP no âmbito do Programa de Pesquisas em Caracterização, Conservação, Restauração e Uso Sustentável da Biodiversidade (BIOTA). Também contou com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Petrobras.
O artigo Intensive silviculture enhances biomass accumulation and tree diversity recovery in tropical forest restoration (doi: https://doi.org/10.1002/eap.1847), de Pedro H. S. Brancalion, Otávio Campoe, João Carlos Teixeira Mendes, Camilla Noel, Gabriela G. Moreira, Juliano van Melis, José Luiz Stape e Joannès Guillemot, está publicado em: https://esajournals.onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1002/eap.1847.
Na parte de cima, o resultado alcançado com a estratégia tradicional de silvicultura; na parte de baixo se observa a evolução da biodiversidade com a adoção da silvicultura intensiva (fotos: Pedro Brancalion
Fonte: FAPESP

terça-feira, 28 de maio de 2019

Alunos de escola do Recife criam ‘ecobarreira’ para filtrar lixo em canal.

Estudantes da Escola Municipal Professor Antônio de Brito Alves, na Mustardinha, na Zona Oeste do Recife, colocaram em prática o aprendizado teórico sobre preservação do meio ambiente. Através de uma “ecobarreira” feita com garrafas pet, os quase 30 alunos estão comprovando a eficácia do protótipo, que desde a segunda (13) tem retido o lixo do canal do ABC, em frente à escola.
Nesta terça (14), já era possível ver o lixo se acumulando. O protótipo sustentável foi feito com garrafas pet unidas por um cabo, formando uma rede capaz de reduzir a quantidade de resíduos sólidos no canal. A ideia surgiu a partir da realidade do bairro.
“Muita gente estava ficando doente e aí decidimos fazer a ‘ecobarreira’, para que o lixo não passe para o canal e a água fique limpa”, diz o estudante Gleybson Suruagy, de 13 anos.
Orientados por quatro professores, os estudantes iniciaram as pesquisas em 2015, na própria comunidade, junto aos moradores da região. “A gente perguntou se as pessoas sabiam em quanto tempo o lixo se decompõe e mais de 70% dos moradores não sabiam e jogavam lixo no canal”, diz Carlos Henrique Barbosa da Silva, de 12 anos.
Com a ajuda da Autarquia de Manutenção e Limpeza Urbana do Recife (Emlurb), a “ecobarreira” foi implantada na segunda (13). “É muito gratificante saber que estamos ajudando as pessoas e o planeta”, declara a estudante Clara Sales, de 14 anos.
Orgulhosa do projeto, a professora Maria Lopes é uma das quatro educadoras que atuou na criação da “ecobarreira” com os alunos. “Vamos fazer um estudo para ver a quantidade de lixo recolhida e implantar outras ‘ecobarreiras’ na região”, afirma. 
O projeto vai contar com o apoio da prefeitura, segundo a diretora de manutenção da Emlurb, Marília Dantas. “Apoiamos na instalação e vamos apoiar no monitoramento, verificando a quantidade que está sendo recolhida para que os alunos tirem suas próprias conclusões”, diz.
Desenvolvido desde 2015, o projeto conquistou o primeiro lugar na Feira de Conhecimentos do Recife em 2018 e foi credenciado para uma feira de ciência e tecnologia no Paraguai, no segundo semestre de 2019.
Fonte: G1 PE e TV Globo

segunda-feira, 27 de maio de 2019

Imitando as plantas: fotossíntese artificial cria combustível líquido limpo.

Químicos da Universidade de Illinois, nos EUA, conseguiram desenvolver uma nova forma de fotossíntese artificial. Com isso, foram capazes de produzir com sucesso combustíveis usando água, dióxido de carbono e luz. Ao converter dióxido de carbono em moléculas mais complexas, como o propano, essa descoberta deixa a humanidade mais perto do uso de CO2 para armazenar energia solar.

A fotossíntese é um dos processos mais incríveis da vida na Terra. As plantas usam a luz solar para impulsionar reações químicas entre a água e o CO2, criando e armazenando energia solar na forma de glicose de alta densidade energética. No novo estudo, os pesquisadores desenvolveram um processo artificial que usa a mesma porção de luz verde do espectro de luz visível usado pelas plantas durante a fotossíntese natural para converter CO2 e água em combustível, utilizando como catalisadores nanopartículas de ouro ricas em elétrons.
“O objetivo é produzir hidrocarbonetos complexos e liquefeitos a partir do excesso de CO2 e outros recursos sustentáveis, como a luz solar. Os combustíveis líquidos são ideais porque são mais fáceis, seguros e econômicos de transportar do que o gás e, como são feitos de moléculas de cadeia longa, contêm mais ligações – o que significa que eles acumulam energia mais densamente”, explica Prashant Jain, professor de química e co-autor do estudo, em matéria publicada no site da Universidade de Illinois.
Os benefícios de realizar fotossíntese artificial em grande escala seriam enormes, dando-nos uma fonte de energia limpa e auto-sustentável que poderia um dia alimentar nossas casas e carros simplesmente imitando o que plantas e outros organismos fazem naturalmente.
Por causa disso, os cientistas estão procurando uma maneira de aproveitar a energia solar como uma fonte de combustível fotossintética ilimitada, até porque ela também pode fornecer um meio de nos ajudar a reaproveitar o perigoso CO2 atmosférico.

Ouro combustível

A nova pesquisa se baseia em um trabalho anterior liderado por Jain em 2018, no qual o uso de nanopartículas de ouro como um substituto para a clorofila foi estudado. “Os cientistas muitas vezes procuram plantas para obter insights sobre métodos para transformar luz solar, dióxido de carbono e água em combustíveis”, disse Jain na época.
Nesses experimentos, a equipe descobriu que minúsculas partículas esféricas de ouro medindo apenas nanômetros de tamanho poderiam absorver luz verde visível e transferir elétrons e prótons foto-excitados.
Na nova pesquisa, Jain e Sungju Yu, pesquisador de pós-doutorado e autor principal do estudo, usaram os catalisadores metálicos para absorver a luz verde e transferir elétrons e prótons necessários para reações químicas entre o CO2 e a água – preenchendo o papel da clorofila na fotossíntese natural.
Segundo os pesquisadores, as nanopartículas de ouro funcionam particularmente bem como catalisadores porque suas superfícies interagem favoravelmente com as moléculas de CO2, são eficientes em absorver a luz e não se degradam como outros metais. 

Artificial x natural

Existem várias maneiras em que a energia armazenada nas ligações do combustível de hidrocarboneto é liberada. No entanto, o método convencional de combustão acaba produzindo mais CO2 – o que é contraproducente para a noção de colheita e armazenamento de energia solar, afirma Jain.
“Há outros usos potenciais menos convencionais dos hidrocarbonetos criados a partir desse processo. Eles poderiam ser usados ​​para alimentar células de combustível para produzir corrente elétrica e tensão. Existem laboratórios em todo o mundo tentando descobrir como a conversão de hidrocarbonetos em eletricidade pode ser conduzida de forma eficiente”, disse Jain.
Por mais empolgante que o desenvolvimento desse combustível de CO2 para líquido possa ser para a tecnologia de energia verde, os pesquisadores reconhecem que o processo de fotossíntese artificial de Jain está longe de ser tão eficiente quanto é nas plantas. “Precisamos aprender a ajustar o catalisador para aumentar a eficiência das reações químicas. Então, podemos começar o trabalho duro de determinar como ampliar o processo. E, como qualquer tecnologia de energia não convencional, haverá muitas questões de viabilidade econômica a serem respondidas também”. [Science AlertUniversidade de Illinois]
Fonte: Hypescience

sábado, 25 de maio de 2019

O cientista que percorre milhares de quilômetros para salvar uma das águias mais misteriosas da América do Sul.

Um encontro com uma águia morta mudou a vida do cientista argentino José Sarasola. Ele havia acabado de se formar na universidade e começava seus trabalhos de conservação ambiental na província de La Pampa, no centro do país, quando viu a ave caída perto de uma cerca.
“Era uma águia-cinzenta jovem que havia sido abatida com arma de fogo, e foi meu primeiro encontro com uma destas aves”, relata.
“Ela foi propositalmente colocada ali, porque existe uma crença, não só nesta região mas também na Patagônia, e em relação a outras espécies consideradas prejudiciais para o gado, como raposas e pumas, que expor os indivíduos abatidos dessa maneira mantém outros animais longe.”
O pesquisador diz que o encontro foi marcante para seu futuro na conservação ambiental. Sarasola decidiu a partir dali se dedicar a proteger a água-cinzenta (Buteogallus coronatus), uma das mais ameaçadas de extinção na América do Sul.
Em sua missão de protegê-la, Sarasola desafia crenças e percorre milhares de quilômetros para levar sua mensagem aos povoados locais e escolas remotas.
E seu trabalho lhe rendeu neste mês um dos maiores reconhecimentos na área, o prêmio Whitney, entregue anualmente pela fundação de mesmo nome sediada na Inglaterra.

Espécie era quase desconhecida

A águia-cinzenta pode ser encontrada no Sul do Brasil, no Paraguai, na Bolívia e na Argentina, até o norte da Patagônia.
A União Internacional pela Conservação da Natureza, uma organização sediada na Suíça, diz que a espécie corre risco de extinção e estima sua populção global em menos mil indivíduos reprodutores.
Estas águias vivem principalmente em habitats áridos ou semiáridos formados por arbustos, pastagens e bosques, onde se alimenta dos animais que vivem nestes locais, principalmente tatus e serpentes, explica Sarasola.
O cientista fundou em 2001 o Centro de Estudo e Conservação das Aves de Rapina da Argentina (Cecara) na Universidade Nacional de La Pampa, por meio do qual começou a estudar a ecologia da águia-cinzenta.
“A espécie era quase desconhecida, não só para a população local, mas também para a ciência, já que o último registro de aninhamento havia sido feito há mais de 25 anos no noroeste argentino”, destaca Sarasola.

Águias eram perseguidas e morriam afogadas e eletrocutadas

A primeira ameaça identificada pelo Cecara foi a perseguição de águias por humanos pela crença de que “comem as ovelhas”. Sarasola também registrou casos de águias que morreram afogadas acidentalmente nos reservatórios de água para gado nestas regiões secas.
Outro grande perigo foi identificado quando o biólogo colaborou com o Centro de Biologia e Conservação do Estado de Virginia, nos Estados Unidos, para colocar rastreadores por satélite nas aves.
“Descobrimos que elas morriam eletrocutadas nos fios elétricos. É um problema que afeta especialmente as grandes aves, como as águias, porque ocorre quando o animal faz contato com dois cabos condutores ao mesmo tempo, algo que só aves maiores conseguem fazer ao voar a partir ou para os postes que sustentam a fiação”, diz Sarasola.

Rampas e pontes

Para evitar os afogamentos, Sarasola e seus colegas criaram o que chamam de “rampas de resgate”, uma estrutura feita com uma tela de arame para ligar a borda do tanque ao fundo. Assim, os pássaros e outros animais selvagens conseguem sair dos reservatórios e podem beber água com segurança.
Isso fez a mortalidade da fauna silvestre nos tanques equipados com rampas cair pela metade, e nenhuma águia-cinzenta foi encontrada afogada em um deles.
Quanto às mortes por eletrocutamento, o monitoramento das linhas de energia permitiu detectar os postes mais perigosos que, apesar de serem apenas 1% do total na área, eram responsáveis por quase 20% das mortes das aves.
“A característica que os torna tão perigosos é que são construídos em concreto (que são condutores de eletricidade por serem construídos com aço por dentro) e têm uma alça do cabo elétrico acima deles. As aves podem ser eletrocutadas ao estar empoleiradas no poste e, ao mesmo tempo, tocar na alça suspensa.”
De acordo com Sarasola, a solução foi simplesmente colocar essas alças abaixo do topo do pilar.

Mudando crenças

Para combater a perseguição das águias pelos moradores locais, os cientistas monitoraram e filmaram as presas das águias. “Analisamos mais de 600 presas e nenhuma delas era de gado doméstico, então, o motivo do conflito não era real.”
Os biólogos mostraram as filmagens e fotos de águias levando para seus ninhos presas de espécies silvestres como tatus, roedores e serpentes.
E explicaram a importância destas aves como predadores no topo da cadeia alimentar daquele ecossistema, ao se alimentarem de um grande número de serpentes venenosas e cobras.
Hoje, o conhecimento da espécie é muito maior. “Um exemplo disso é que, em dezembro de 2016, um artista local fez uma escultura de uma águia que logo foi colocada na praça principal da cidade de Santa Rosa, capital da província de La Pampa”, diz o cientista.

A águia que chora

Sarasola percorreu milhares de quilômetros no oeste dos pampas argentino, uma zona árida de pouca densidade populacional, para levar sua mensagem às crianças. Os biólogos foram a escolas rurais para apresentar um documentário feito por Sarasola com o jornalista Matías Sapegno.
O filme A Águia que Chora conta a história verídica de um adolescente da região que descobre a espécie e seu ninho e participa com pesquisadores do estudo e monitoramento de uma águia-cinzenta jovem.
As crianças e suas famílias têm sido fundamentais nestes esforços, porque têm informações importantes sobre a localização dos ninhos e casais de águias. “É impossível reunir essas informações por conta própria em uma região tão vasta”, diz Sarasola.
As escolas visitadas pelos cientistas ficam em locais muito remotos e distantes de centros urbanos. Os alunos vivem nas escolas e voltam para suas casas a cada 15 ou 20 dias.
“Perguntamos nas conversas se eles conhecem alguma espécie que corre risco de extinção, e as referências deles são de outras espécies emblemáticas e conhecidas mundialmente, mas não vinculadas à sua realidade, como tigres e pandas”, diz Sarasola.
“O que primeiro chama sua atenção é saber que vivem muito próximo de uma espécie nesta condição e que podem observá-la, com um pouco de sorte, no próprio pátio da escola ou em suas casas.”
Fonte: BBC

sexta-feira, 24 de maio de 2019

Cidades latino-americanas criam aliança para melhorar gestão de recursos hídricos.

Mais de 100 representantes de megacidades latino-americanas, de empresas de água e saneamento e de universidades reuniram-se em São Paulo (SP) nesta semana (7 e 8) em evento organizado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) para discutir desafios e soluções relacionados à gestão da água diante das mudanças climáticas. O encontro também debateu a criação de uma Aliança Regional de Megacidades para a Água e o Clima.

Os representantes das cidades concordaram que mesmo tendo características específicas, as soluções para garantir segurança hídrica nas megacidades podem ser compartilhadas. Participaram da conferência representantes de Bogotá, Buenos Aires, Cidade do México, Rio de Janeiro, São Paulo, Lima e Santiago.

Mais de 100 representantes de megacidades latino-americanas, de empresas de água e saneamento e de universidades reuniram-se em São Paulo (SP) nesta semana (7 e 8) em evento organizado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) para discutir desafios e soluções relacionados à gestão da água diante das mudanças climáticas.
O encontro também debateu a criação de uma Aliança Regional de Megacidades para a Água e o Clima. Participaram da conferência representantes de Bogotá, Buenos Aires, Cidade do México, Rio de Janeiro, São Paulo, Lima e Santiago.
“Estamos aqui hoje para criar uma plataforma de cooperação entre as megacidades para que elas encontrem juntas as soluções para a gestão dos recursos hídricos, que já se tornam escassos em grande parte delas, e para a mudança climática, que deixa o cenário ainda mais desafiador”, disse o especialista do Programa Hidrológico Internacional da UNESCO, Alexandros Makarigakis.
“A ideia é que as megacidades descubram o poder que têm para resolver seus problemas em relação à sua mais básica segurança hídrica”, completou.
O presidente do Sindicato Interdepartamental de Saneamento da Região Metropolitana de Paris (SIAAP, na sigla em francês), Joakim Giacomoni-Vincent, alertou que todos os países têm os mesmos problemas no que se refere às mudanças climáticas. “Há dez anos, estávamos falando sobre isso como um problema futuro, e agora estamos tendo que resolvê-lo”.
No primeiro dia de evento, participantes discutiram os desafios atuais e futuros da mudança climática que impactam a segurança hídrica na região da América Latina e Caribe, os riscos para suas atividades econômicas e estabilidade social, e as possíveis soluções para essas questões. As megacidades participantes apresentaram seus sistemas de água e saneamento, desafios atuais, questões emergentes e formas de planejar e gerir a água no futuro.
Na opinião do diretor da Associação de Pesquisa e Governos Locais sobre Água (ARCEAU Île-de-France), Jean-Claude Deutsch, para além das características de cada megacidade, existem alguns pontos macros em comum, e a preocupação com os recursos hídricos é um deles.
Os representantes das cidades concordaram que mesmo tendo características específicas, as soluções para garantir segurança hídrica nas megacidades podem ser compartilhadas. Em São Paulo, por exemplo, por estar longe do mar, de lagos e de rios caudalosos, “a cidade acaba se tornando um grande laboratório de ideias para fornecer água segura para a população”, explicou o secretário executivo de Relações Internacionais do município, Luiz Álvaro.
O diretor de regulação da ANA, Oscar Cordeiro Netto, disse acreditar que “a distribuição dos recursos hídricos é um desafio em todo o Brasil, pois apesar de termos abundância de água doce, grande parte da população está onde a água não está”. Para ele, esse fato ainda pode se agravar e gerar conflitos, pois “a demanda por água deve aumentar 30% nos próximos 20 anos no país”.
No segundo dia, um grupo restrito de especialistas conheceu melhor o funcionamento da Aliança de Megacidades para a Água e o Clima (MAWAC, na sigla em inglês) e discutiu o Termo de Referência para uma aliança regional na América Latina e Caribe.
Eles concordaram com a criação desta aliança e a ideia de que, daqui para frente, ela deve melhorar a Cooperação Sul-Sul entre as megacidades latino-americanas e caribenhas, nos campos relacionados a pesquisa, soluções técnicas, educação, informação e políticas públicas relacionadas à gestão hídrica.
Para o presidente da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (SABESP), Benedito Braga, os grandes impactos das mudanças climáticas se fazem sentir no setor dos recursos hídricos. “Seja pelas enchentes mais intensas e frequentes, seja pelas secas mais prolongadas e frequentes. A agenda da adaptação é fundamental e, nesse contexto, uma aliança para tratar do tema mudanças climáticas e água é extremamente importante”.
“Soluções criativas e inovadoras, capazes de aglutinar meios e recursos para melhorar a vida nas megacidades devem estar nas nossas mesas de discussão. A aliança das megacidades se torna uma solução inteligente de ajuste da gestão hídrica aos cenários das mudanças climáticas”, disse o secretário executivo do Comitê Gestor dos Serviços de Água e Esgoto da Capital Paulista, Marco Palermo.
O secretário-executivo da organização Governos Locais para a Sustentabilidade (ICLEI), Rodrigo de Oliveira Perpétuo, complementou dizendo que “a cooperação multinível e multi-atores é o caminho para o fortalecimento de uma aliança regional para a gestão das águas nas megacidades”.
O evento foi realizado pela Sede da UNESCO, pelo Escritório Regional da UNESCO para Ciências na América Latina e Caribe (UNESCO em Montevidéu) e pelo Escritório da UNESCO no Brasil, no âmbito do Programa Hidrológico Internacional da UNESCO (IHP, na sigla em inglês). O encontro também serviu de preparação para a Conferência Internacional da MAWAC (EauMega 2020), que acontecerá na Sede da UNESCO, em Paris (França), no próximo ano.
Fonte: ONU