Melodia que sai do lixo



publicado em 14/10/2012 às 00h00.

Melodia que sai do lixo

Jovem da periferia de São Paulo reaproveita madeiras de móveis encontrados em entulhos para construir instrumentos musicais
Da redação
redacao@folhauniversal.com.br
publicado em 14/10/2012 às 00h00.





Nos braços de David Rocha, a embuia de uma velha mesa e a araucária de uma antiga gaveta, ambas encontradas no lixo e transformadas em violino, levam música à periferia de São Paulo. O instrumento foi fabricado pelo próprio musicista, de 22 anos.
O violino é o primeiro feito pelo luthier – profissional que constrói instrumentos musicais – com madeiras encontradas em um entulho e o que tem um valor especial para ele. “Gosto mais do violino que fiz do que aquele que comprei. É algo inexplicável. O som é especial”, diz o paulistano de São Miguel Paulista, na zona leste da cidade. 
Com o que descobre no lixo, Rocha já construiu rabecas (instrumento tipicamente nordestino), violão, cavaquinho, bandolim e até uma harpa, sua nova paixão. “As cordas são de um violão velho e os pinos, de um piano antigo”, conta. “Sou o único que sabe fazer esse tipo de instrumento na oficina e aprendi a tocá-lo sozinho.”  Na oficina de luteria, onde a madeira de abeto norueguês encontrada no Mercado Municipal de São Paulo dará origem ao tampo de um cavaquinho, Rocha é, além de aprendiz, monitor de outros alunos. O trabalho realizado no Galpão de Cultura e Cidadania e mantido pela Fundação Tide Setúbal, na zona leste da capital, dá ao jovem uma renda mensal.
Apaixonado pela música desde a infância, foi aos 16 anos que ele ganhou seu primeiro violão, comprado pelos pais em várias parcelas. Teve aulas de violino e conheceu o curso de luteria aos 18 anos. “Como no Brasil tudo é caro, resolvi recolher as madeiras do lixo. Elas são melhores, pois são envelhecidas naturalmente, o que faz o som ter alta qualidade.”
Especialista em identificar tábuas de onde podem sair algum som, o jovem diz identificar a madeira pelo cheiro, pelo desenho e pela acústica de cada peça. “Bato na madeira para identificar a vibração”. Atento ao caminho percorrido com a reportagem da Folha Universal, ele encontra uma cama de marfim jogada na rua. “Depois eu volto para pegar”, sorri. 
Ainda que tocar música e construir instrumentos envolvam processos diferentes, a paixão de Rocha pelas duas atividades é a mesma. Além de ter o próprio ateliê, ele sonha com o dia em que poderá tocar o violino que fez na Sala São Paulo. “É onde as melhores orquestras se apresentam”, diz ele, referindo-se à sede da Orquestra Sinfônica de São Paulo (Osesp) e uma das mais importantes salas de concertos do País. Do dó ao si, Rocha já sabe como fazer o ré, mi, fá, sol para chegar lá.

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